domingo, 4 de março de 2012

A Origem da Vida: A Origem do Carbono

O carbono merece um destaque especial porque a química do ser vivo usa e abusa deste elemento. Por que o carbono? Todos sabem que a química da vida é baseada no carbono, embora não seja óbvio por quê. É claro que outros elementos são importantes também, como hidrogênio, oxigênio, nitrogênio e enxofre, metais etc., mas dentro do contexto de vida e de processos vitais, lidaremos essencialmente com um esqueleto de carbono ligado aos outros elementos.

Apesar de o carbono exibir características químicas que o tornam adequado ao processo vital, tem também que preencher um outro requisito: a abundância. Para que possamos dar prosseguimento à narrativa, temos que fazer uma breve consideração sobre como surgiram os elementos que compõem o Universo, principalmente o carbono.

A razão para a seleção do carbono como o elemento vital se deve a suas propriedades químicas peculiares, que serão enumeradas e explicadas mais adiante.

Conforme já mencionamos, especula-se que as partículas fundamentais da matéria – prótons, elétrons e nêutrons -, que coletivamente podem ser chamadas de bárions, tenham se formado 15-5 segundos depois do Big Bang. A escala que mostra os principais eventos depois do Big Bang encontra-se abaixo.

Linha de tempo do Big Bang


Nota-se no diagrama que aos 3 minutos ocorre a nucleossíntese. Para nossa discussão sobre o carbono (e outros elementos também), essa é a etapa que mais importa. Durante a nucleossíntese, os elementos propriamente ditos se formaram.

A formação dos elementos só foi possível depois que a enorme energia inicial do Big Bang dissipou-se o suficiente para que os bárions – partículas subatômicas, como o pronto do núcleo atômico – pudessem se associar formando os átomos e, consequentemente, os elementos. Para que a nucleossíntese pudesse ocorrer era necessário contar com uma “janela” na qual o nível de energia não poderia ser aquele inicial, mas ainda bastante alto. Supostamente, essa janela foi atingida no terceiro minuto da criação do Universo.

O processo de fusão nuclear pode ser observado nas estrelas. No Sol, por exemplo, a enorme energia produzida, e que em parte sustenta a vida na Terra, é o resultado da fusão nuclear. No Sol e em grande número de estrelas, a produção de energia decorre da fusão de átomos de hidrogênio. O átomo de hidrogênio só tem um próton (cinza) e, assim, antes de gerar o hélio, conforme mostrado na figura abaixo, fundiu-se com um nêutron, gerando o deutério. Em seguida, o deutério e um nêutron, adicionado ao trítio, geram, então, o elemento hélio.

Formação de hélio por nucleossíntese a partir de deutério e trítio.


Quando todo o hidrogênio se esgotar no Sol, o que provavelmente acontecerá daqui a cerca de 5 bilhões de anos, o próprio hélio será consumido, dando origem à formação de elementos mais pesados. Nesse momento, o Sol se converterá numa estrela gigante vermelha e atingirá um volume muito maior que o atual. Bem antes dessa época, a vida na Terra já teria se extinguido, porque as temperaturas na superfície do planeta serão tão altas que, por exemplo, não haverá mais água; todos os oceanos ferverão e o vapor de água já se dissipará no espaço. A própria crosta terrestre assumirá uma consistência semelhante à lava vulcânica. Se ainda estivéssemos vivos, poderíamos observar o Sol ocupando todo o céu visível. Dada a proximidade com o Sol, nesse momento a Terra seria inevitavelmente engolfada pelo gigante vermelho, fazendo companhia a Mercúrio e Vênus. Mas essa é uma outra história. Voltemos ao começo.

Ainda durante os minutos inicias do Universo, a nucleossíntese prosseguia gerando outros elementos além do hidrogênio e do hélio. Segundo o processo chamado de triplo alfa, o carbono teria se formado. A formação do carbono pela reação do triplo alfa é mostrando na figura abaixo.


Formação de carbono pela reação triplo alfa.


Nessa reação, dois átomos de hélio se fundem formando o núcleo do berílio. Em seguida, um núcleo de hélio e um núcleo de berílio se fundem, formando então o núcleo excitado do carbono-12, cuja característica é a emissão de raios gama. Esse processo do triplo alfa já foi confirmado experimentalmente.

Com essa informação podemos aceitar que a reação que deu origem ao carbono é de fato o processo triplo alfa, e que essa fusão ainda ocorre nas estrelas. Assim, os seres vivos da Terra são verdadeiramente filhos de estrelas que provavelmente nem existem mais.

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O carbono reúne várias características não encontradas em outros elementos; dentre estas, podemos destacar as principais:

1- Pode estabelecer quatro valências diferentes. Com si próprio, ou com outros elementos, tais como o oxigênio, o nitrogênio, o enxofre e o hidrogênio. Essa propriedade química também confere ao carbono a capacidade de formar compostos ramificados. Dentre os elementos mais abundantes na crosta terrestre, o carbono é sabidamente aquele que forma o maior número de compostos.

2- As valências entre o carbono e os vários outros átomos, embora estáveis nas temperaturas terrestres, possuem energias de ligações não muito altas. Isso significa que é possível romper as ligações com energias que são facilmente obtidas na célula viva. Essa situação é compatível, portanto, com processos reversíveis, o que para a homeostasia característica das células vivas é muito importante.

3- Os compostos de carbono (em especial os hidrocarbonetos) são praticamente infinitos em sua variedade estrutural.

4- As valências entre o carbono e outros átomos e radicais possuem uma flexibilidade tal que as estruturas tridimensionais podem apresentar muitas formas diferentes. Isso significa que as valências do carbono sofrem torções que tornam possíveis a aproximação de muitos grupos reativos. Essa é, na verdade, a base da reação enzimática e da ligação entre ligantes e receptores.

A tabela abaixo mostra as abundâncias relativas de vários elementos no Sol e na crosta terrestre.

Abundância relativa dos elementos


Percebe-se claramente que o carbono possui uma abundância relativa que fica abaixo da do hidrogênio, do oxigênio e do silício, por exemplo. Nessa lista, o carbono ocupa o oitavo lugar. Podemos concluir então que, para a formação da vida, o carbono foi de fato selecionado por suas propriedades e não apenas pela abundância.

A propriedade de formar quatro valências não é exclusividade do carbono. O silício, que é muito mais abundante na crosta terrestre que o carbono, também forma quatro valências. Por outro lado, o silício não forma valências com a mesma diversidade apresentada pelo carbono.

A tabela abaixo mostra as valências mais comuns do carbono, juntamente com as suas energias de ligação – a energia necessária para romper estas ligações. Para entender o que é energia de ligação, imagine que você esteja segurando dois ímãs que estão ligados um ao outro. O esforço para separá-los equivale à energia necessária para romper valências químicas.


Valências mais comuns do carbono.


Esse parâmetro dá uma ideia da afinidade entre átomos que fazem parte de uma determinada valência. Quanto mais alta for a energia de ligação, mais estável a molécula, e de uma certa forma, menos reativa. Conforme veremos mais adiante, a célula viva só é viável porque contém um conjunto de moléculas que, no contexto das reações químicas, caracterizou-se por apresentar energias de ligação não muito altas. Tal situação facilita a reversibilidade das reações, as degradações de uma forma geral, a substituição de radicais etc. Se, ao contrário, as moléculas fossem muito estáveis e, portanto, mais inertes, pouco reativas, haveria uma menor possibilidade de que as reações ocorressem com a energia disponível na célula viva, ou ao seu redor. Ao conjunto de reações químicas que ocorrem nas células dá-se o nome de metabolismo.

Os compostos à base de silício apresentam diferenças consideráveis no que tange ao metabolismo. Vários autores (mormente de ficção científica) já propuseram que em outros ambientes o silício poderia também formar a base química de vida alienígena. Entretanto, esses autores também levaram em consideração que, no caso do silício, as valências são pouco flexíveis (mais resistentes a torções), o que restringe o número de tipos possíveis de estruturas tridimensionais. Outras valências do silício são muito estáveis, como nas moléculas dos silicatos. Por exemplo, o silicone, um polímero à base de silício, é formado por ligações alternadas entre o Si e O. Essas ligações são muito estáveis, pouco reativas, o que nem sempre é vantajoso no ambiente da célula viva. Compostos pouco reativos produziriam um metabolismo excessivamente lento. Além disso, a maioria dos polímeros de silicone é insolúvel na água, o que dificultaria muito o contato entre os reagentes e, em consequência, as reações entre estes.

Há ainda a situação inversa, como aquela de alguns compostos de silício cujas valências são muito instáveis. Por exemplo, os silanos – polímeros apresentando ligações diretas entre átomos de silício. Os silanos são estáveis apenas em temperaturas muito baias e, além disso, degradam-se facilmente na água. Quem sabe os silanos seriam a base da química vital em um ambiente bem mais frio do que aquele na Terra?

Como já foi mencionado, compostos do silício são pouco solúveis, o que também se torna um problema quando consideramos as reações químicas que envolvem gases. Por exemplo, a molécula do SiO2, equivalente ao dióxido de carbono ou gás carbônico (CO2), é sólida à temperaturas ambiente (o cristal de quartzo é comumente encontrado como areia). Por outro lado, sabemos que o CO2 é gasoso (pode formar uma atmosfera) e é altamente solúvel em vários solventes, sobretudo a água. Essas propriedades favorecem reações químicas envolvendo o CO2 devido a sua rápida difusão em vários meios distintos, ao contrário do quartzo. A solubilidade de um composto num determinado solvente permite uma velocidade de reação muito maior que aquela verificada entre reagentes sólidos.

Ao contrário do silício, o carbono permite a existência de literalmente milhões de compostos diferentes. Essa diversidade inclui pequenas moléculas orgânicas e polímeros. Os hidrocarbonetos incluem estruturas lineares e ramificadas, o que aumenta enormemente a diversidade destas moléculas. Ademais, pode-se afirmar que sempre é possível acrescentar mais um átomo de carbono a um hidrocarboneto.

Além dos hidrocarbonetos, existem outras grandes moléculas nas quais ocorrem ligações C-C. Os exemplos mais atuais são os fulerenos, que podem apresentar uma rica coleção de formas, e também os nanotubos de carbono. Em comparação, os polímeros à base de silício são mais monótonos, isto é, não exibem a variedade de estruturas poliméricas observadas nas células, dentre as quais apenas as proteínas apresentam milhares de variantes.

Percebe-se, diante desses dados, que na probabilidade de ocorrência de reações químicas sob as condições ambientais encontradas na Terra primitiva e na contemporânea, as moléculas à base de carbono claramente destacam-se. Compreende-se assim que a probabilidade de que o carbono – não um outro elemento – tenha constituído a base da vida aumente devido ao enorme acervo molecular disponível para reações diversas, mesmo em condições abióticas.

Desse modo, a ocorrência do carbono na crosta terrestre torna plausível uma situação na qual os compostos de carbono, assumindo a mais variadas estruturas, tenham interagido entre si, formando uma malha complexa que oportunamente adquiriu propriedades distintas, que hoje denominamos vida.

Para reforçar ainda mais a versatilidade do carbono, sabemos que além dos compostos normais encontrados nos seres vivos, este elemento pode assumir estruturas cristalinas, cujas propriedades físico-químicas entre si são muito distintas. Exemplos clássicos são o grafite, cujas aplicações são múltiplas (lápis, lubrificantes especiais e reatores nucleares) e o diamante.

Veremos depois como o carbono, a água e outros ingredientes básicos da vida podem ter chegado à Terra.





1. Introdução
1.1 Como a Vida Surgiu e Como Evoluiu
2. A Origem da Vida
2.1 Monismo e Dualismo
2.2 O Universo
2.3 O Universo em Expansão
2.4 Outros Modelos do Universo






Fonte: Readaptação de AB INITIO de Franklin David Rumjanek

4 comentários:

  1. Ñ GOSTEI NENHUM POUCO!!!!!!!!!!!!!

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  2. Obrigado Muito Bom msm...Me foi de grande ajuda!

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  3. ola, estou com uma duvida poderia me ajudar? como o hidrogenio surge origem no hidrocarbonetos, sei que carbono restos organicos, mas e o hidrogenio. aguardo.

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  4. ola, estou com uma duvida poderia me ajudar? como o hidrogenio surge origem no hidrocarbonetos, sei que carbono restos organicos, mas e o hidrogenio. aguardo.

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